. Prometo intentar no volve...
. Duele
. Sinmigo
. Wordporn
. Deixa
. Restart
De entre todas as coisas que gosto em ti, é o teu olhar que me prende.
É ele que me arrebata.
Parece um lugar comum mas não é o caso. De lugar comum, o teu olhar nada tem.
O teu olhar amarra-me. Enleia-me numa teia da qual não consigo, nem quero, desligar-me. Torna-me cárcere de desejos e emoções.
Prende-me. Prende-me os sentidos, prende-me o coração, prende-me a língua, a fala, os tendões das mãos, as rótulas dos joelhos, as articulações dos tornozelos, e o sorriso idiota com que fico depois de o ver.
É por isso que tenho esta dificuldade em descrever, analiticamente, o teu olhar.
Impossível! Rendo-me às evidências da minha incompetência, do teu olhar.
O teu olhar não se resume a um mero globo ocular e a uma íris coberta por uma córnea.
O teu olhar é responsável pela captação da luz do sol inteira, deixando escuro qualquer meio-dia, e reflecte, dos seus 25 milímetros de diâmetro, uma alma interminável.
A tua luz atinge qualquer objecto como uma precisa visão raio-X de todas as artérias do meu coração.
Obrigas-me a penetrar nesse tecido aquoso, pela pupila, a entrar no globo ocular e a atingir o cristalino.
Absorves-me os raios de sol todos, paralelos, vindos do infinito, e converges-me na fóvea central da tua retina.
Uma água infindável onde convergem todos os raios luminosos... e o meu coração.
Um ponto focal sobre a retina onde milhões de células fotossensíveis reagem.
Através do teu nervo óptico é o meu cérebro que é afectado.
Descarregas em mim mil imagens num processamento contínuo de sensações.
Desfazes-me o córtex visual e esmurras-me o peito por dentro.
Olhas-me.
São os teus olhos que me vêem. Mas sou eu que através deles que tenho uma visão perfeitamente nítida do paraíso.
Queria tanto agarrar na tua mão e dizer-te que ainda vamos a tempo de roubar a esse tempo toda a felicidade do mundo. Apenas. Tivesse essa palavra a forma e intensidade certa para abrir novamente a porta... Apenas. Queria tanto que o brilho de ter essa palavra na minha retina e o seu ecoar no meu ouvido fizesse estremecer o corpo de forma a apagar tudo o resto. Tivesse não tanto o ler mas o escutar dessa palavra o poder de cicatrização emocional. Apenas.
Não são gestos e palavras, sejam elas quais forem, que fazem mudar mas antes algo de inexplicável e forte... que chamam de amor apenas! Tantas foram as vezes, e provavelmente outras tantas serão que as nossas atitudes não acompanham as nossas palavras... e os nossos gestos não traduzem a nossa vontade... mas talvez exista alguém que sabe no fundo o que somos e que confia nisso!
Que qualidade a gente deve esperar de alguém com quem pretende ter um relacionamento?
Aquelas que se esperaria do melhor amigo. O resto, é claro, seriam os ingredientes da paixão, que vão além da amizade. Mas a base estaria ali, na confiança, na alegria de estar junto, no respeito, na admiração, na qualidade, em não poder imaginar a vida sem aquela pessoa, em algo além de todos os nossos limites e desastres.
Talvez seja um bom critério. Não digo de escolha, pois amor é instinto e intuição, mas uma dessas opções mais profundas, arcaicas, que a gente faz até sem saber, para ser feliz ou para se destruir. Eu não quereria como parceiro de vida quem não pudesse querer como amigo. E amigos fazem parte dos alicerces emocionais, são um dos ganhos que a passagem do tempo nos concede.
Falo daquela pessoa para quem podemos telefonar, não importa onde ela esteja nem a hora do dia ou da madrugada, e dizer: "Estou mal, preciso de você". E ele ou ela estará com a gente pegando um carro, um avião, correndo alguns quarteirões a pé, ou simplesmente ficando ao telefone o tempo necessário para que eu me recupere, me reencontre, não me mate, seja lá o que for.
A amizade é um meio-amor, sem algumas das vantagens dele, mas sem o ónus do ciúme, o que é, cá entre nós, uma bela vantagem. Ser amigo é rir junto, é dar o ombro para chorar, é poder criticar (com carinho), é poder apresentar namorado ou namorada, é poder aparecer de chinelo de dedo ou roupão, é poder até brigar e voltar um minuto depois, sem ter de dar explicação nenhuma.
Penso com carinho nos carinhos que não virão, nos caminhos que não mais se cruzarão, nas coisas que, eu sei, vou esquecer. E nas que não. Lembro das coisas que talvez você lembraria e acho graça pensando que elas podem ter se passado bem além do seu campo de visão.
Fico feliz por a sua vida continuar por afinal ter tantos amigos, lugares para ir e convites para partilhar. Tudo se sabe. Boa sorte para os dois.
Queria segredar ao teu ouvido, num sussurro inaudível - "Amo-te".
Apenas. Só.
E tu compreendias.
Pronto, estava feito.
Condensava nesta palavra tudo aquilo que te queria dizer e tu percebias, e absorvias na perfeição.
"Amo-te". Apenas.
Entendias todas as dimensões da palavra, numa morte a todas as figuras de estilo, (metáforas e hipérboles incluídas), sem descrições polissilábicas ou excessos adverbiais, sem quando, como, porquê, quem ou onde, sem sujeito, predicado, complemento directo ou indirecto.
Com obliteração de vírgulas, pontos finais ou exclamações, e num afogamento completo das interrogações que te passam pela cabeça. Sem analogias a outra relações, uma oração simplificada.
As vogais essenciais e as consoantes Q.B.
Um encontro vocálico de ditongos inexistentes (crescentes, decrescentes, abertos ou nasais).
Completamente sem entoação, acentuação e até com ausência de pronúncia.
Um "amo-te" depurado de sílabas e translineações.
Sem grau ou flexão.
Sem pronomes ou advérbios.
Um rasgar determinante - dos possessivos, demonstrativos, relativos, interrogativos ou indefinidos.
Sem locuções adverbiais escondidas.
Sem preposições ( contracções ou locuções), interjeições ou derivações.
E depois tudo voltava ao normal.
O teu sorriso voltava a sorrir e desmanchava-se para me dizer de volta:
- Eu também.
Um "amo-te" apenas.
Limpo. Mas pleno de significado.